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Em 19/01/2010 por Arthur Antunes Coimbra

A violência que castiga o futebol



A última vez que escrevi uma Conexão ZNR sobre um ato de violência foi em maio do ano passado, quando contei a ofensa moral sofrida pelo nigerino Maazou, jogador negro do CSKA que diante dos meus olhos foi vítima de racismo covarde por torcedores do Dínamo de Moscou. Aquele fato me levou a denunciar o caso nos microfones e a ligar para a assessoria do meu amigo Michel Platini, presidente da Uefa. Pedi um olhar mais atento da entidade máxima da Europa para tais atos. Meses depois tive meu pedido atendido e hoje há punições severas previstas para situações semelhantes. A minha coluna desta semana novamente fala de violência, mas desta vez a que se dá através da agressão física de fato.

Jogamos no último domingo na cidade de Kavala contra o time local, meu último no comando do Olympiacos, e deixamos o campo com um empate sem gols. Mas a verdade é que o futebol pouco importou, infelizmente. Antes do jogo, torcedores invadiram o gramado, duelaram com policiais e com outros torcedores. Bombas eram ouvidas e nosso time ficou preso no vestiário desde uma hora antes da partida começar pelo temor em relação a nossa integridade física. Nos escanteios, garrafas plásticas e objetos eram arremessados nos bandeiras, nos jogadores, como se todos fossemos alvos numa batalha. E, no intervalo, cadeiras arrancadas eram exibidas dentro do campo por torcedores que, novamente, invadiram o gramado. Eu, que voltava com o time para o segundo tempo, tive que me proteger. Um de nossos reservas não teve a mesma sorte e foi atingido na cabeça. Depois da partida, soubemos que a briga continuou fora do estádio. E o jogo do Aris chegou a ser interrompido por falta de segurança.

Fui submetido a uma situação que não imaginei que viveria. Tive que seguir para uma entrevista coletiva cercado por dez seguranças que estavam ali para garantir a minha integridade físicaQuero deixar bem claro que a minha demissão do clube não teve a ver diretamente com essa coluna, que já estava pronta desde a segunda-feira. Mas é duro ter que relatar estes fatos. E teve mais. Pessoalmente, fui submetido a uma situação que não imaginei que viveria. Tive que seguir para uma entrevista coletiva cercado por dez seguranças que estavam ali para garantir a minha integridade física. Nosso ônibus foi escoltado por mais de uma dezena de carros de polícia, teve que usar caminhos alternativos e entrar por portões laterais na nossa chegada. A sensação que nós temos em momentos como esse é a de que estamos fugindo. E eu jamais imaginei que trabalhando no futebol teria que me proteger, que teria a minha segurança ameaçada no exercício do meu trabalho. Nesta segunda-feira, fiquei dentro de casa aqui em Atenas refletindo e ao mesmo tempo imaginando que, pelo menos em casa, estou seguro.

Aonde o futebol vai parar assim? Isso é que eu me pergunto o tempo todo. Os milhões que estão em jogo, o profissionalismo, tudo que envolve o futebol como negócio deveria ter tornado este ambiente mais organizado. Mas não é o que vejo. Muito pelo contrário. E essa sensação me deixa extremamente triste, principalmente porque o esporte é para mim uma grande paixão.

Presenciei em minha passagem pela Turquia aquele que pensava ter sido o pior episódio de violência de minha carreira. A torcida do Galatasaray simplesmente destruiu o próprio estádio de uma forma impressionante. Cadeiras, fogo, brigas, foi como se passasse um furacão incontrolável, mas era uma torcida. Não imaginei que um dia estaria dentro de um furacão como aquele. E estou.

Vou confessar que não sei até quando agüentarei viver dentro do futebol dessa forma, quanto tempo ainda sigo como treinador. Ao longo de quase 40 anos dentro deste mundo da bola poucas vezes me peguei tão decepcionado e descrente. O episódio aqui obviamente mexe mais comigo, mas poderia citar o que aconteceu no Brasil no jogo do Coritiba contra o Fluminense na última rodada do Brasileiro do ano passado. Poderia citar episódios em vários países e inúmeros casos de jogadores que são agredidos por torcedores. Só que quando você está dentro da história, o sentimento é muito mais intenso. Eu me sinto impotente neste cenário. Poucas semanas atrás estava atuando no Maracanã com quase 80 mil pessoas prestigiando ex-jogadores e jogadores atuais defendendo a solidariedade. Tive relatos de camisas do Vasco, Botafogo, Fluminense nas arquibancadas. Tivemos paz, o que me dá a sensação de que ela é possível. Hoje, aqui estou quase fugindo com o time do Olympiacos, precisando de seguranças para falar com as pessoas. É muito difícil de aceitar isso depois de tudo que já vi e vivi.

Mas, assim como fiz no episódio do Maazou, venho através da Conexão pedir o olhar mais atento de entidades como a Uefa e a própria FIFA, para estes casos de violência. Tem que haver punição severa aos times, às federações. A Inglaterra deu o exemplo há alguns anos e hoje todo treinador pensa em trabalhar por lá. Organização, estrutura e segurança são o mínimo. O que peço aqui é o direito de trabalhar dignamente, só isso. Se o futebol reflete a vida que levamos hoje em nosso planeta, penso que já passou da hora de tomarmos atitudes. A violência está fora de controle.

Até a semana que vem!




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